Foto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula
E aí que, neste fim de semana, recebi a triste notícia de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi diagnosticado com câncer na laringe. Deu um aperto no coração. Admiro muito o Lula, e é uma tristeza sem fim que ele tenha que enfrentar essa barra. O diagnóstico saiu no sábado e nosso ex-presidente se internou no hospital Sírio Libanês, um dos melhores de São Paulo, para iniciar o tratamento, que vai passar por sessões de quimio e radioterapia e, possivelmente, uma cirurgia.
Enquanto eu aqui torcia para que Lula vencesse essa luta, surgiu uma campanha entre aqueles 13% que não aprovaram o governo Lula sugerindo que o ex-presidente “desse o exemplo” e, em vez de se tratar em um hospital particular, fizesse seu tratamento pelo sistema público de saúde, o SUS (Sistema Único de Saúde).
O que essas pessoas sugerem é que Lula sofra na pele a ineficiência da saúde pública como tantos brasileiros com câncer sofrem e já sofreram, muitos morrendo prematuramente por falta de tratamento adequado. Na semana do dia 24/10/11, os médicos do SUS fizeram uma greve em 21 estados para reivindicar melhores condições de trabalho. Médicos que recebem salários ridículos e trabalham demais em locais sem estrutura e condições precárias. Faltam leitos, profissionais, medicamentos (vale lembrar que os médicos de convênios particulares fizeram paralisação parecida por melhores salários e menos interferência dos convênios das decisões médicas).
Esta é uma campanha fortemente baseada na ignorância e na hipocrisia.
Ignorância porque às vezes acho que as pessoas esquecem da história de vida do Lula. Não se lembram que o ex-presidente, retirante nordestino fugido da seca, vem de um passado de muita pobreza e dificuldades e sabe muito melhor que tantos políticos o que é ter serviços públicos como única opção. As pessoas parecem não lembrar, por exemplo, que Lula já experimentou o gosto amargo da ineficiência do sistema público de saúde quando enfrentou a morte dupla da primeira esposa (aos 22 anos) e do primeiro filho em um hospital público (Hospital Modelo). Esta matéria sobre a moça, Maria da Silva de Lourdes, destaca trecho de uma entrevista em que Lula diz: “No sétimo mês da gravidez, ela pegou hepatite. Ninguém me tira da cabeça que ela morreu por negligência da rede hospitalar do Brasil, por problemas de relaxamento médico. (…) Ela poderia ter sido melhor tratada. Morreu sem que houvesse nenhuma assistência para ela. Eu fui ao hospital e vi. Ela gritava, ela gritava, ela gritava. Não tinha um médico para atender, não tinha ninguém(…). Hoje, eu tenho consciência de quanto um desgraçado de um pobre passa nos hospitais”.
E hipócrita porque não é uma campanha para que políticos tenham maior compromisso com a qualidade dos serviços. É para que Lula, e Lula especificamente, sofra.
Não vi ninguém cobrando do governador de São Paulo Geraldo Alckmin (médico por formação, aliás) ou do ex-prefeito paulistano e ex-governador paulista José Serra, alguns dos muitos políticos de alto escalão que frequentam o Sírio Libanês há anos, que troquem o tratamento particular no hospital pelo SUS. Eles por acaso são menos responsáveis que Lula pelo sistema público de saúde em São Paulo (cidade e estado), que comandam há anos (PSDB está há 20 anos no comando do estado)?
Alguém fez campanha para que o ex-presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, internasse dona Ruth Cardoso em um hospital público, quando ela foi internada no hospital Sírio Libanês por conta de problemas cardíacos? Graças a Deus, não. Nem dona Ruth nem Fernando Henrique mereciam esse desgosto num momento tão sensível e difícil.
Mas FHC, Serra e Alckmin por acaso tem menos dever de dar o exemplo que Lula? Vale lembrar que a presidenta Dilma Roussef e o ex-vice, José de Alencar, também se trataram de câncer no Sírio. Não ouvi um pio sobre SUS nesta época, mesmo se tratando de petistas.
E aí, a “culpa” pela situação do SUS é de quem? E como resolver isso, com sangue político?
Acredito que manifestos, ainda que de sofá (como os deste blog e as campanhas pelo Facebook), são exercícios válidos de democracia e só contribuem para uma sociedade em que todos tem seu direito à palavra. Acredito que devemos, sim, levantar a voz para pressionar o governo para fazer valer nossos impostos e cumprir seus deveres de Estado com a nação. Porém, não acho que protestar com ignorância e hiprocrisia seja construtivo.