É o cara que mexe comigo no meu caminho pro trabalho, me irritando logo de manhã.
O outro que está no mesmo elevador e se mete na minha conversa com a colega pra falar “as mulheres são assim mesmo…”.
É o colega de trabalho que faz piada sobre minha vida sexual quando vou tomar um café na copa. A colega que me aconselha a me “preservar mais”, porque estou ficando “falada”. O chefe que faz piadinha falando pra eu ir pra reunião com um decote maior, porque pre-ci-sa-mos fechar negócio. A chefe que, também brincando, me fala pra, pelamordedeus, não engravidar esse ano porque seria ruim para a empresa.
É o amigo que acha que a única explicação lógica para eu estar nervosa é estar “naqueles dias”. O ex que me pergunta se eu engordei. O otorrino que vê que mudei de nome por conta do divórcio e se sente à vontade para me repreender como se eu fosse uma criança que fez caca.
O professor do MBA que faz piadinha de mulher na aula e chama homens pelo nome e mulheres pela característica física (“fala, ruivinha”). O outro professor que fala que não existe machismo em agência de publicidade (HAHAHA!) e que isso é papo de “blogueira feminista”.
É o governador que dificulta a vida de mulheres que tiram licença maternidade, priorizando mulheres sem filhos e homens. O babaca do Twitter que defende o governador falando que mulher é muito egoísta, tudo querendo engravidar pra “ganhar sem trabalhar”. É o RH que concorda secretamente com isso e, mesmo sabendo que é ilegal, sempre dá um jeito de perguntar nas entrevistas de emprego quando quero ter filhos.
É a propaganda na TV que quer me vender sabonetes íntimos e absorventes diários para que eu esteja sempre “limpa” e “fresca”. Que coloca mulheres nos comerciais de produtos de limpeza e servindo a homens em bares, e homens curtindo a vida, dirigindo carrões, conquistando o mundo. Que me oferece dezoito milhões de soluções contra “gordurinhas indesejadas” e que sugere que eu mude totalmente meu cabelo para ficar bem.
É eu precisar que meu namorado me acompanhe na volta do metrô pra casa depois das aulas, porque mulher andando na rua sozinha a essa hora tem altíssimas chances de ser abordada…
Uma coisinha atrás da outra. O tempo inteiro. Todos os dias. Um dia atrás do outro.
Sabe. Dá pra me dar uma porra de um descanso? Dá pra esquecer que eu sou mulher por meia hora, por gentileza? Puta canseira.
Às vezes, dá muita vontade de fazer a Glenn Close em Albert Nobbs e sair por aí disfarçada de homem, só pra me livrar dessa pedra no sapato que são os machisminhos diários. E olha que eu adoro ser mulher!
Foto destaque: mulher segura chave como arma para se proteger na rua, daqui.